Simples assim

Entrou esbaforido no pequeno apartamento, vindo do interminável lance de escadas. O elevador já estava quebrado havia uma semana, mas nem o fato de ter de se exercitar nos degraus o tirava do sério. Afinal, era sexta-feira. Um pouco chuvosa, mas ainda sexta-feira.
Abriu a porta, largou o chaveiro na cristaleira e percebeu algo estranho. Não sabia o quê, mas alguma coisa estava fora do lugar. Talvez fosse a luz apagada da sala de estar – o que nunca acontecia, graças à regra estabelecida entre os dois para mostrar movimento no imóvel.
Podia ser também o barulho, ou melhor, a falta dele. Mesmo assim, tudo estava no lugar, apesar de escuro e silencioso. Caminhou até a mesa de jantar e percebeu um papel. Era uma carta. Ao lado, uma rosa desbotada e com espinhos, como aquelas guardadas dentro de livros.


Amor,

Não pense que foi falta de carinho ou paixão. Te deixo apenas por saber que foi suficiente o que vivemos juntos. Acredite, foi intenso e bonito. Desculpe o clichê, mas foi bom enquanto durou. Se cuida.

Beijos,
De seu agora ex-amor.
Leu as curtas linhas do papel brochura e ficou estático. Por um minuto, pensou em tudo que vivera ao lado dela e das alegrias que teve naquele período. Sua despedida era surpreendente, mas no fundo entendia seus motivos.
Largou o papel, foi a cozinha e procurou algo dentro da gaveta do armário. Desistiu. Abriu a geladeira, pegou uma lata e foi à sacada. Abriu o anel e tomou o primeiro gole. Afinal, era sexta-feira. Um pouco chuvosa, mas ainda sexta-feira.

autoria: Julio Simões - data: 04/12/06

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