Buenos Aires: turismo para reconstruir

No final de 2001, o povo argentino reuniu-se em frente à Casa Rosada, sede do governo federal, para protestar contra o então presidente Fernando de la Rúa. Munidos de panelas, as pessoas gritavam contra uma crise que vinha crescendo há algum tempo e estava fazendo com que o argentino “empobrecesse”, já que o peso argentino não tinha mais a mesma força que o dólar.

Menos de dez anos depois, passaram as manifestações, trocaram o governo do país mais algumas vezes e desde então a Argentina vem se reerguendo. E uma das formas em que os nossos hermanos apostam para voltar a viver em condições dignas é o turismo. Mesmo passando apenas cinco dias na capital argentina, Buenos Aires, é possível ver como eles sabem capitalizar bem os pontos turísticos que tem.

La pasión boquense


Não sei se por viver numa capital aonde o turismo parece se esconder em meio ao caos urbano, mas o fato é que me admirou a capacidade argentina de explorar o turismo que tem. Nas ruas do centro, além de relativamente bem cuidadas, é muito fácil achar um “locutório” para ligar a um custo qualquer parte do mundo. Além disso, não são raros os pontos de informação turísticas espalhados pela região da avenida Nove de Julho.

Tango en la calle


Se não bastasse essas mínimas atitudes de uma cidade que se considera turística, Buenos Aires ainda sabe o que oferecer aos visitantes. Tem belas e bem cuidadas praças, oferece segurança e facilidade para o turista se locomover pelas ruas sem se preocupar e ainda sabe explorar os pontos turísticos propriamente ditos. Em vários lugares você se depara com lembranças (ou regalos) ou com opções de visitas guiadas – e cobradas.

No bairro do Caminito, por exemplo, é possível ver apresentações de tango ao ar livre e ainda comprar o artesanato local. Em La Boca, a visita dentro do estádio do Boca Juniors, a famosa La Bombonera, tem um custo – e no Museu de la Passion Boquense outro, mais caro. A popular feira de San Telmo, então, realizada aos domingos, é a festa daqueles que vivem do artesanato e do turismo local.

Artista


Tudo isso pode parecer óbvio, mas acredito que não é. Buenos Aires é a cidade-sede das maiores empresas do país e tem representantes de tantas outras corporações influentes do mundo, é onde está instalado o poder executivo – com a sede do governo e a residência presidencial bem perto do povo, inclusive – e ainda tem espaço para ser atraente turisticamente.

É admirável, então, o quanto São Paulo não sabe ser assim. Odeio comparações, mas é impossível não olhar a planejada Buenos Aires e pensar como não soubemos transformar uma das maiores cidades da América Latina num lugar mais rentável turisticamente. Medidas simples e investimento na infra-estrutura trariam para São Paulo ainda mais força continental. Temos quase tudo a oferecer, creio eu. Só falta organizar.

Sumido, hein?

Tem poucas coisas que me irritam mais do que aquela frase "tá sumido, hein?". Porque eu não posso sumir em paz, hein? Nem sumir mais eu posso? Ok. Mas abro uma excessão e aceito ouvir isso de um dos três ou quatro leitores mais ou menos fiéis deste blog. E explico o motivo da demora: fiquei longe no carnaval e estou com preguiça de escrever.

Enfim, mas prometo aos pobres leitores que volto em breve. Quem sabe amanhã, até. Isso porque ainda tenho um capítulo para escrever sobre a viagem para a Argentina. E quero publicar um texto de pseudo-literatura - como a maioria já visto aqui - sobre a minha mania de seguir pessoas no metrô (mas garanto: não sou psicopata). Até lá.

Buenos Aires: Oslo é logo ali

A primeira idéia que se tem quando se escolhe viajar para qualquer país da América Latina é que não serão raros os encontros com conterrâneos. Afinal, brasileiro é uma praga e dá em qualquer lugar. Com todo o respeito, claro. Em Buenos Aires, então, que é praticamente “a casa ao lado”, não deveria ser diferente. Mas, pelo menos para mim, foi.

Embora antes de deixar o país eu tivesse visto reportagens indicando o aumento da procura por Buenos Aires nas férias, não encontrei tantos brasileiros quanto esperava. Isso me dava uma certa angústia, afinal você fica mais nacionalista quando deixa para trás a sua terra natal.

Tanto que no hostel (nome moderninho para os velhos e tradicionais albergues da juventude), eu era o único nascido no país do samba, futebol e mulatas. E só. O resto era de outros países da América ou da Europa. E o pior disso tudo: a maioria que pude constatar vinha da... Noruega! Sim, o gélido país da península escandinava dominava o local.

Pelo que lembro ter contado, cerca de dez noruegueses estavam hospedados no hostel. E todos em pequenos grupos sem ligação uns com os outros. Era na hora que todos sentavam para bater papo que eles iam se descobrindo. E passavam a falar um dialeto pouco compreensivo, sonoramente parecido com o alemão.

Mas porque diabos os noruegueses escolheram Buenos Aires, capital de um país sub-desenvolvido que passou recentemente por uma grave crise econômica? Creio que pelo baixo custo da viagem para eles – se para o resto da Europa que adota o Euro e para nós, brasileiros, é vantajoso ir, imagine para eles! – e pelo fato da Noruega ser fria nessa época.

Quanto a personalidade dos noruegueses, pelo menos daqueles que estavam por lá, pode-se dizer que são bastante comunicativos. Mesmo assim, não chegam nem aos pés daqueles que tem influência latina, como italianos e chilenos, outras duas nacionalidades com que tive contato por lá.

Além de Chile, Itália e Noruega, era comum encontrar gente da Dinamarca, de Israel, da Inglaterra, do Canadá e da Austrália. À noite, me sentia numa verdadeira reunião das Nações Unidas. Os assuntos, porém, passavam de bebidas típicas dos países até a troca de experiências e muito, mas muito, assunto relativo à língua de cada país.

Nesses dias, pude tirar algumas conclusões. A típica frase “o mundo fala inglês” é mentira. A maioria fala só o seu dialeto e pronto. Assim, por falar um inglês enferrujado e um portunhol canalha, acabava sendo usado como intérprete entre chilenos e noruegueses. E se os países não declararam guerra até agora, creio que cumpri bem meu papel.

Outra coisa é relativa à imagem do Brasil no exterior. Além de ser abordado quase sempre para opinar sobre o futebol brasileiro, ainda era perguntado sobre a qualidade das praias brasileiras, sobre as mulheres e, pior, sobre o nível de violência. É incrível quanto os gringos acham que estamos em guerra civil.

Ok, até estamos, mas não é para tanto. Sempre quando me deparava com uma dessas visões distorcidas, tentava explicar que estamos sujeitos a violência em Buenos Aires, no Rio ou em Oslo – ok, a Noruega não entra nisso. E incentivava a visita a destinos brasileiros, como Florianópolis e Salvador. Era praticamente um voluntário do turismo nacional.

Já quanto a personalidade de cada um, é difícil definir e traduzir em palavras. Afinal, todo mundo estava ali para conhecer lugares e pessoas. E essa talvez seja o grande trunfo de se conhecer outros países e culturas. Porque, embora tenha ido para a Argentina, sinto que conheci um pouco mais de cada país que estava ali e aprendi muito mais sobre o mundo.

Buenos Aires: parques, cafés e o silêncio

São cinco horas da tarde no bairro de San Telmo, em Buenos Aires, capital da Argentina. O ritmo não é veloz como o de São Paulo, mas as pessoas ainda caminham pelas calçadas em ritmo de trabalho. O sol ainda permanece alto, tão radiante quanto o exposto no centro da bandeira nacional.

Mesmo assim, algumas pessoas param para curtir o gramado verde e uniforme do praça de San Martin, localizado ao final da rua Florida, ou calle Florida no dialeto local. Todas contemplam o tempo, sentadas ou deitadas sobre o tapete verde. A tranqüilidade é contagiante, dá vontade de fazer o mesmo.

Alguns casais aproveitam a vista para se aproximarem uns dos outros. Do lado, um grupo de crianças corre ladeira abaixo e alguns vão rolando pela grama. Lindo. Alguns ainda vestem suas roupas de banho para aproveitar o verão portenho. Se não há praia por perto, devem pensar, vamos ao parque mesmo.

Retrato


Assim são os espaços públicos verdes de Buenos Aires. Como uma cidade planejada que é, estes locais bucólicos e paradisíacos são mais comuns do que se pode imaginar. E este é o grande trunfo da cidade, que apesar do desenvolvimento de uma metrópole ainda soube preservar tais ambientes.

Além disso, Buenos Aires também se caracteriza por ser uma cidade de poucos ruídos. Não se ouve buzinas como em São Paulo, provavelmente a capital mundial do motorista impaciente. Os argentinos também falam baixo. Ou melhor, falam num tom normal, sem gritos nem discussões.

Tapete


E isso faz com que a cidade tenha um som harmonioso, gostoso de ouvir. Mais agradável que isso só parar para ouvir o som natural da cidade nos inúmeros cafés que compõem as principais vias da cidade, como a avenida Nove de Julho. Perfeito.

E elas estão lá, as cadeiras e mesas, prontas para você. Vale a pena passar antes em alguma banca de jornal (ou kiosco, como chamam) e adquirir um periódico – aconselho Clarín – para passar a tarde exercitando o espanhol e curtindo a paisagem.

Cafés


Como não poderia deixar de ser, foi o que fiz. Numa manhã ensolarada como poucas, parti em busca de um Clarín e de um lugar para sentar na via mais famosa da capital argentina. Naquela hora, ainda de manhã, era pouca a movimentação de carros e pedestres, o que deixava ainda melhor a situação.

Porque, além de tudo, a cidade de Buenos Aires deve ser contemplada assim, em seus mínimos detalhes. Quando for, saia à rua num exercício de flanêur. Busque cantos calmos, de paisagem até certo ponto comum, mas cheio de magia. Respire fundo e pense na vida. Faz bem.

Mais fotos de Buenos Aires no Flickr: http://www.flickr.com/photos/juliosimoes

Buenos Aires: a cidade que respira futebol

Começo a série de posts sobre a minha visita à capital argentina, Buenos Aires, abordando a paixão pelo futebol. Depois dessa, ainda virão outras micro-reportagens sobre a cidade, cada uma sobre um aspecto que observei. Aproveitem... e amanhã tem mais!

Pense numa cidade aonde as camisas alusivas a clubes de futebol são vestimentas quase oficiais dos cidadãos. Um lugar aonde a rodada é discutida nas esquinas, nos cafés, dentro dos táxis. Poderia ser esta a descrição de qualquer cidade brasileira, mas assim é Buenos Aires, capital da Argentina.

Pode-se dizer que os argentinos são muito mais fanáticos por este esporte do que nós, brasileiros. Ou pelo menos eles demonstram muito mais do que a gente. Em todo lugar, há referências ao futebol local. Nos estabelecimentos comerciais, sempre tem alguma lembrança – ou regalo, no dialeto local – que faça referência ao esporte.

Nos restaurantes, existem tevês sempre ligadas em canais esportivos. Em dia de jogo, a cidade diminui seu ritmo para acompanhar a rodada do Campeonato Argentino, que é dividido em Apertura (julho a dezembro) e Clausura (janeiro a junho). Em dia de jogo da seleção, que não tive como presenciar, creio que a mobilização seja a mesma.

Logo que desembarquei em Buenos Aires, tive contato com a paixão portenha pelo futebol. Enquanto era levado até o centro da cidade, a cerca 30 quilômetros do aeroporto internacional de Ezeizer, troquei “figurinhas” futebolística com o taxista. Torcedor do Boca Juniors, o motorista de aparentes 50 anos perguntava coisas sobre o futebol do Brasil.

Explicou-me que no caminho ficava a sede da AFA (Associação de Futebol da Argentina), local de treino da seleção nacional quando concentrada no país. Perguntou sobre os times brasileiros mais fortes e foi citando logo de cara São Paulo e Santos. Pensei em incluir o Atlético-PR na lista, mas meu portunhol ainda não permitia conversas mais complexas.


Solo uno hincha

Assim, durante toda a viagem pude perceber o encanto dos argentinos pelo futebol. Como no Brasil, há sempre dois meninos batendo uma bola, principalmente nos inúmeros e amplos parques da capital. E como todo admirador do esporte, não pude deixar de ir a um estádio argentino.

Assim sendo, logo na primeira tarde fui conferir La Bombonera, estádio do Boca. O apelido dado faz referência a forma do estádio, que de cima parece com uma caixa de bombons. E realmente o lugar é bem acanhado, fato que deve deixar o adversário esmagadoramente pressionado em dia de jogo.

Vazio, como vi, porém, o estádio não passa de normal. É bonito, mas falta algo. Provavelmente a torcida boquense, que segundo um vendedor com quem conversei em outra situação é composta por metade do país – a outra metade, disse ele, é formada por hinchas de todos os outros clubes, desde o grande River ao modesto Nueva Chicago.

Panorâmica II de La Bombonera Panorâmica II de La Bombonera Panorâmica II de La Bombonera


Dessa forma, pode parecer muita pretensão, mas acho que a Argentina também poderia ser classificada como o país do futebol. Eles têm bons times, bons jogadores e são tão apaixonados pelo esporte quanto a gente. Mesmo assim, ainda acho que Pelé é infinitamente melhor que Maradona. Que me desculpem os argentinos!

Mais fotos de Buenos Aires no Flickr: http://www.flickr.com/photos/juliosimoes

Em terras argentinas

Já estou em terras argentinas e posso dizer que nossos vizinhos tem que seus méritos, que serao explicados nos momentos mais apropriados. Pretendia colocar posts dia a dia daqui, mas vejo que será complicado. Portanto, pretendo selecionar bem os assuntos e dividir este tal "diário" em partes que abordem esse universo argentino. Pois bem, fica para depois a cobertura de meus cinco dias na Argentina. O que posso dizer é que vou postar coisas pequenas quando puder, sem prometer nada. Entao, hasta luego.

Plin Plin - Parte 2

Se durante a manhã minha visita à TV Tem de Bauru, afiliada da Rede Globo, se limitou ao estúdio, a parte da tarde foi quase toda fora. Pedi para acompanhar uma equipe de reportagem na chamada “externa”, que só pelo nome é possível deduzir o que é. Depois de um almoço leve pela região, voltei para esperar o carro e o repórter.

O aval para que pudesse acompanhar a reportagem na rua foi dada por Odair, popularmente conhecido como seu Dadá. Ele, além de motorista, era o cinegrafista na ocasião. A simpatia em pessoa, sempre preocupado com que eu pudesse acompanhar as atividades do repórter, no caso, Marco. Este, aliás, é uma promessa do telejornalismo local e vou explicar o porquê mais adiante.

Assim sendo, rumamos à Câmara Municipal de Bauru às 14 horas para acompanhar a volta dos vereadores após o recesso do final de ano – veja bem, começaram em 5 de fevereiro, 36º dia do ano. No carro com o logotipo da tevê, somente eu, seu Dadá e Marco. Do lado de fora, o calor de aproximadamente 35 graus.

Já na Câmara, decidi auxiliar os dois, que além de tudo ainda tinham que carregar o equipamento. E acreditem: não é só de câmera e microfone que se faz uma matéria. Fiquei com as fitas, umas cinco caixas plenamente identificadas. E só. Não quiseram dar ao nobre estagiário de “acompanhamento” – termo que ouvi algumas vezes ao longo do dia – mais nada. Piedade, cautela, desconfiança? Sei lá.

A questão é que lá dentro, uma sala ampla e condicionada (ufa!), era possível avistar um público assistindo a primeira sessão ordinária da Casa. Eu diria que a sessão realmente foi ordinária, de tão chata e confusa que foi. Se você já teve o desprazer de assistir ou de pelo menos passar pelo canal da TV Câmara, já tem uma idéia. Agora, imagine: ao vivo é impossível mudar de canal!

Enquanto Marco e Dadá seguiam a pauta (a tentativa da Prefeitura em reaver o aeroclube de Bauru, já que agora a cidade conta com um amplo e moderno aeroporto), eu seguia Marco e Dadá. Fui aos confins da Câmara para ver – e gravar - um mapa da região em litígio. Explicação para cá, explicação para lá, e como sempre quase nada esclarecido.

Momentos depois, porém, ainda viria o pior. A tal sessão ordinária. Meu Deus, nunca tomei tanta água nem café quanto aquele dia. E pior: nunca fui tão cumprimentado. Desde que percebi que os políticos vinham até mim na expectativa de estar agradando um eleitor bauruense, passei a contá-los.

Foram no mínimo oito, num lugar em que existiam 15 representantes da população (mais três da presidência e afins, estes “estrelas” demais para sair da tribuna). A sessão citada, porém, é um caso a parte. Um circo, praticamente. Um show, talvez, já que era televisionado para toda Bauru pela televisão própria.

A cara dos vereadores era o melhor. Todos, absolutamente todos, tinham cara de político. Se eu visse um deles na rua, seria capaz de apontar e dizer que “só pode ser político”, tamanha a alegoria. Enfim, o “circo” da Câmara estava armado e a movimentação era típica de feira aos domingos ou de uma sala de aula de sétima série.

Todos fora dos lugares, em pé, conversando paralelamente enquanto o presidente da Casa ou qualquer outro colega de profissão discursava na tribuna. A organização, sim, era o forte do lugar. Tanto que a ordem do dia tinha previsto a escolha dos representantes para as comissões internas, que decidiram assuntos específicos e relacionados ao município.

Até aí tudo bem, se os caras não se atrapalhassem até quando a coisa já havia sido acertada informalmente. O maior exemplo foi quando o presidente da Câmara anunciou um vereador em uma comissão e não era o combinado. Isso porque para chegar a essa confirmação eles tinham que ir até um microfoninho no meio e indicar quem do partido iria assumir a função, seguido da confirmação do próprio escolhido.

Escancarado o erro, eis que o presidente resolve interromper por tempo indeterminado a sessão e convocar todos os “coleguinhas” para voltar à sala fechada e redefinir toda a divisão. E se não bastasse tudo isso, tinham que ser anunciadas 11 (!!!) comissões naquele dia. Foi nesse meio tempo, porém, que pude conversar mais com Marco Paiva, o tal repórter promissor citado anteriormente.

Digo isso porque ele realmente aparenta ser bom. Não tem medo de falar com os políticos (até porque pouco cobre política e não está nem aí para as críticas que recebe) e se mostra bastante eficiente na profissão. Além disso, faz uma das coisas que sempre quis fazer no jornalismo: reportagens interativas, bizarras, nonsenses, chamem como quiser. O que vale dizer mesmo é que o ícone maior deste gênero ainda pouco explorado no Brasil é Márcio Canuto.

A conversa sobre isso, aliás, se iniciou com uma intervenção de uma telespectadora, presente na platéia da Câmara. A senhora se levantou ao ver o repórter, foi até ele cumprimenta-lo pela reportagem “do dia 25”, como ela mesmo disse. Pegou nas mãos dele, que se mostrou atencioso, e conversou por alguns minutos, sempre elogiando seu trabalho. Praticamente uma celebridade.

A tal reportagem do dia 25 era a especial de Natal. Na época, Marco já havia iniciado essa prática de reportagens leves, bem humoradas e junto ao povo. E aquela consistia em realizar um curso de Papai Noel, ministrado em Jaú (SP), para depois exercer a função num shopping da cidade. E assim, passado o curso (devidamente registrado pelas câmeras da TV Tem), o articulado repórter partiu para a missão junto às crianças. Tudo isso ao vivo no jornal do meio-dia.

Além desta matéria de sucesso, Marco ainda citou que saltou de pára-quedas ao vivo no aniversário de Bauru e ainda participou de um baile da terceira idade. “Dancei com as velhinhas lá, foi demais”, contou rindo, enquanto aguardávamos a volta do recesso. A mudança de comportamento dele diante da lente foi explicada na seqüência.

“A emissora fez uma pesquisa há um tempo e constatou que os repórteres e apresentadores eram “engessados” demais. Nisso, fui tentando mudar um pouco o esquema das reportagens. No começo gaguejava e errava tudo, mas era elogiado. Recebíamos muitos e-mails positivos. Mas foi com a saída do chefe para férias que “chutei o balde”. Quando ele voltou, não me segurou mais”, explicou o repórter, que revelou ter sido inclusive elogiado por J. Havilla, dono da TV Tem.

No retorno do recesso, não muito tempo depois, tudo transcorreu normalmente. As comissões foram corretamente anunciadas, Marco gravou com gente da oposição e da situação e eu não via a hora de sair de lá. Estava interessante acompanhar a reportagem, o que não agüentava era o clima político.

Assim, depois de quase cinco horas lá, deixamos correndo o lugar. Não por ser insuportável, mas por estar próximo do segundo jornal. Já na redação, Marco voou para escrever e gravar o off antes das 19 horas, hora do segundo TemNotícias. E novamente a redação fervia. Corre-corre, ilhas cheias, apresentador se arrumando. E novamente, na hora marcada, o jornal estava lá. Como na tevê. Eu também, desta vez vendo tudo do estúdio.

Enfim, embora os “acontecimentos tenham sido registrados entre nove e dezenove horas”, foi possível ter noção de como funciona uma tevê, pelo menos a sua parte jornalística. Também foi interessante ver como nem todos que trabalham nesse meio são arrogantes quanto possam parecer. Comigo, ao menos, todos foram solícitos. E cada vez mais sigo com a vontade de experimentar coisas diferentes no jornalismo. A tevê, inclusive, está cada vez mais nos planos.

Plin Plin - Parte 1

Poderia começar isso tudo com aquela típica frase do seriado 24 horas: "Estes acontecimentos foram registrados entre as dez e onze horas". Seria perfeitamente compreensivo, desde que substituísse as horas do exemplo anterior por nove e dezenove, respectivamente. Sim, fiquei por aproximadamente dez horas acompanhando o trabalho diário em uma emissora de televisão, a TV Tem de Bauru, afiliada da Rede Globo na região noroeste do estado de São Paulo.

Cheguei às 8h30, mas como o expediente do chefe de redação Denílson Monaco só começava mais tarde, fui atendido apenas as 9h10. Logo na chegada, fui apresentado à redação (a sala, não as pessoas) e logo me destinaram um estagiário (!) para mostrar as instalações da tevê. O lugar era pequeno, afinal, muito diferente do que se pode imaginar ser um complexo televisivo como o Projac, por exemplo, da mesma emissora carioca.

No andar superior, por onde se chegava por uma escadinha de poucos degraus e não por um moderno elevador, ficam as ilhas de edição, a própria redação, a sala do Cedoc (Centro de Documentação), a sala de manutenção técnica e outros pequenos lugares que o pobre estagiário soube me dizer o que era. No inferior, ele apresentou os estúdios e o camarim.

Me mostrou aonde os chefes comandam os telejornais da sucursal bauruense (o TemNotícias primeira e segunda edição, além do GloboEsporte local) e as salas onde são gerados programas semanais, como o Revista de Sábado (voltado ao público jovem). No já citado Cedoc, parei para ver a busca por uma fita de 1998 e outra de 2003 sobre pessoas que perderam documentos e tiveram que pagar punições por isso, como ter o nome sujo na praça ou mesmo ser confundido com bandidos e ser preso por isso.

A simpática mocinha estava louca atrás da fita, mas ainda teve tempo de pesquisar no sistema se encontrava alguma fita com o nome do meu pai, Ronaldo, que fora tema de reportagens relacionado a Secretaria Municipal da Saúde de Promissão, que comandava na época, ou seja, nos anos 90 do século passado. Porém, a prestativa moça não teve sucesso na busca e logo voltou ao caso dos documentos perdidos.

Eu, por outro lado, preferi seguir adiante. Nessa hora, o estagiário que me cicceroneava (ah, sempre quis usar isso!) já havia sumido e eu estava em meio ao vai-vem da tevê. Segui para a sala de redação e logo passei a acompanhar um dos editores que recebia os textos de repórteres das outras cidades. O caso agora era sobre um descarrilamento de trem em Botucatu (ou melhor, no meio do caminho).

Ali, soube como se organizam os editores e como funciona o sistema de envio de textos interno. Resumidamente, o cara sai para a rua atrás da reportagem e lá grava as chamadas "passagens", que são aquelas partes em que o repórter aparece falando sobre o assunto direto para a câmera, e as entrevistas com o que eles chamam de "personagens". Isto posto, quando o nobre repórter acha que está bom ele volta para a redação.

Caso seja urgente a matéria ou o cara tenha que se deslocar para outro destino ou até esperar mais coisa acontecer no local da reportagem, a fitinha viaja de moto para a redação para ir sendo editada e produzida para o telejornal mais próximo. O texto de que falavamos antes, porém, pode tanto ser transmitido por telefone celular à redação, quando for necessário imediatismo, ou o repórter pode deixar para redigi-lo quando voltar da rua.

O fato é que esse texto, que segundo os editores sempre vêm com erros, é colocado no sistema e editado pelos mesmos antes de ser dado como "fechado". O processo, aparentemente simples, se complica mais pelo tempo que cada matéria terá ou até mesmo pelo fato da fita (e do repórter e do texto) chegarem em cima da hora do jornal. "Em cima do laço", como eles mesmo dizem.

E, pasmem, o jornal só é fechado durante o próprio jornal. Vi as duas edições do dia e nas duas havia pelo menos uma matéria que ainda era editada nas ilhas enquanto o jornal já era apresentado no estúdio. Aliás, a apresentação do jornal renderia um capítulo à parte. Além dos exercícios bucais que os apresentadores fazem para aquecer - e espantar o medo, acredito eu - ainda tem piadinhas internas com o pessoal que comanda o jornal da "base" já explicada acima.

O clima é bom, mas tenso. Um erro de concordância ou um simples gaguejar já põe em risco todo um jornal. Sem falar nas trocas de ordem das matérias, que acontecem a cada intervalo comercial. Segundo Thaís, a apresentadora a quem tive o prazer de acompanhar por alguns minutos na redação e depois no estúdio, os erros são comuns.

Perguntada qual teria sido seu maior erro, não hesitou e respondeu. "Foi quando eu falei 'mentira' no ar. Disse um número que achei ter lido no TP (tele prompt ou aquele lugar aonde passam as letrinhas para o apresentador ler) e não era. Na hora, emendei um 'mentira' e disse o número certo", explicou Thaís, com um riso constrangido. "É que eu tenho mania de falar isso e desconcentrei", completou.

Além disso, aproveitei a simpatia da moça, que dividia sua atenção comigo e com o computador e com o telefone e com a redação e só, e perguntei o que os apresentadores teimavam em conversar durante os créditos ao final do programa, naquela hora que apaga a luz. Depois de me explicar que os jornais da TV Tem não terminam assim, foi solicita e respondeu que não conversam nada. Absolutamente nada. "É constrangedor até. Demora muito para passar", analisou.

E pela manhã inteira conversei com repórteres que ali chegavam e com editores. Nisso, com o passar da hora, a redação ia fervendo. Literalmente. Era como a água no fogão, onde aos poucos as moléculas passam a se agitar mais e o espaço vai ficando menor e mais tenso. Era quase hora do jornal do meio-dia, o chamado "T1" no dialeto local.

Sem perceber, havia emendado uma conversa com outra editora, que depois de me explicar mais um pouco do andamento da redação, passou a me falar de sua vontade de trabalhar com internet, já que eu havia dito que estagiava na GE.Net. Ela ainda revelou ser de Araçatuba e o papo, que ia bem, só foi interrompido por ela para alertar que faltavam poucos minutos para o jornal.

Fui assistir os primeiros minutos do telejornal na sala de comando. Muita correria para acertar os detalhes com as outras cidades que participariam do jornal, com o link (repórter ao vivo direto de algum lugar, naquele caso uma escola), com a ilha de edição (que ainda preparava coisas para ir ao ar), com os apresentadores, entre eles. Dez segundos antes, um "boa sorte a todos e bom jornal" foi a senha para o início da apresentação.

Durante os quase 40 minutos de programa, tudo normal. Como se vê na televisão. Salvo as conversas no intervalo, regados sempre à uma nova passada nas folhas do script. Encerrado o segundo jornal do dia (antes teve o Bom Dia Cidade, que não acompanhei), a redação voltou ao normal e as conversas paralelas ganharam força. Fui almoçar para acompanhar, durante a tarde, uma cobertura externa. E tudo ia voltar a se acelerar em menos de meia hora.... (continua no próximo episódio).

Solo

Pois é. Vou viajar (sozinho) para a Argentina. Antes que ligue os pontos e se questione, me antecipo e digo que não que deixarei este espaço à mercê das baratas que insistem em habitar o chão mal conservado deste lugar. De lá, mando notícias. E fotos, se conseguir. Essa viagem, apesar de solo, vem em excelente hora. Fundamental, diria.

Há algum tempo sinto que tenho que sair, passear, conhecer lugares e pessoas, tirar fotos, descansar. E não é aquela necessidade latente que me dá quando acabam as aulas. É diferente. Eu preciso viajar, é quase incontrolável. E vou. Já comprei passagem, reservei o hostel, e agora conto os dias. Serão só cinco, mas tudo bem.

É como ouvi numa conversa entre dois aparentes turistas - mochila nas costas, pochete e cara de mundo novo, só pode ser - neste sábado ensolarado (como poucos), na incomparável avenida Paulista. Um para o outro: "Sabe que a única coisa que a gente gasta e leva com a gente é viajar e estudar. Se você comprar um carro, acaba batendo ou roubam. Só se leva viagem ou estudo, mais nada". O interlocutor não respondeu, mas na hora pensei: "É a mais pura verdade".