A vida passa nas ruas

Quanto mais eu caminho pelas ruas, mais adoro São Paulo. Digo isso porque dias atrás tive dois encontros que me fizeram parar e exclamar sozinho: "Ah, é por essas e outras que eu adoro São Paulo". É, enquanto alguns bolam maneiras de fugir, eu me sinto cada vez mais em casa na metrópole de tantos problemas.

Enfim. O primeiro encontro foi numa segunda-feira aparentemente normal, como sempre. Aliás, já eram 0h30 de terça-feira e eu deixava o prédio 900 da Paulista para voltar para casa, também como sempre. Encosto na beira da rua esperarando o sinal para atravessar. Eis que, quando o verde pinta do outro lado, surge um homem magro, bastante careca e com a cara amarrada para me abordar.

Como mandam os especialistas e minha intuição, segui caminhando para evitar assaltos e golpes. Não deixei de ouvir o que ele falava, porém. Em espanhol fluente, o homem me pedia, digamos, uma ajuda de custo, um trocado. Na mão esquerda, entretanto, estava o que me chamou a atenção: uma carteirinha de refugiado. O homem apontava insistentemente para a palavra "refugiado" do pequeno cartão, do qual infelizmente não consegui ler o resto.

Embasado no meu fraco portunhol canalha, treinado e aperfeiçoado recentemente em Buenos Aires, fiquei sabendo que ele era colombiano. Além disso, acredito que tenha ouvido a palavra "Farc" (Fuerzas Armadas Revolucionarias de Colombia). Essa parte, porém, é a única que eu não tenho certeza se ouvi. O que eu sei é que essa conversa de apenas alguns segundos - o tempo de atravessar a rua - me deixou algumas questões latentes que talvez em breve eu relate. Só acho que deveria ter dado mais atenção ao rapaz, pelo menos para saber mais da história.

O outro encontro relevante se deu num domingo ensolarado, também na avenida Paulista. Após um incidente irrelevante (para essa história) no parque Trianon, eu e Josie encontramos um estudante de cinema que buscava informações com a guarda local para rodar cenas de seu novo curta dentro do parque. O tema? Solidão na cidade grande. A partir daí, ficamos quase uma hora discutindo sobre cinema nacional, suas dificuldades e seu crescimento recente. Mais tarde, descobriríamos que o jovem comunicativo é o carioca Vanderson Alves Feitosa.

Há dois meses em São Paulo para estudar e se aperfeiçoar em cinema, Vanderson fazia exatamente o contrário do que pretende escancarar com seu curta: dava e recebia atenção de dois estranhos. Mesmo em pé e na rua, ouvíamos animados algumas histórias de sua vivência na capital paulista, além de parte do roteiro de seu filme e algumas dicas de como filmar um documentário, outra idéia que me surgiu tempos atrás.

Além disso, o cineasta ainda aproveitou para indicar um filme produzido e dirigido por ele: O orgulho da Maré, seu primeiro curta. O filme é a história de sucesso de Léo, jogador de futebol que teve infância e adolescência toda na favela da Maré, no Rio, e conseguiu realizar o sonho de jogar futebol no Flamengo, um dos clubes de maior torcida do Brasil. Assim como Léo, seu personagem no documentário, Vanderson também saiu da Maré para buscar o sonho de ser cineasta.

Enfim. São por histórias como estas que São Paulo me encanta. Cada vez mais, tenho vontade de explorar todos os lugares da metrópole, principalmente os mais simples, como a rua-símbolo da capital paulista. São esses encontros que provam que, diferentemente do que pintam, a maior cidade da América do Sul tem suas belezas e não se resume apenas aos índices de violência. Graças a Deus.

Deixe sua mensagem

- Piiiii.

- ... Olha. Queria te dizer só mais uma coisa... Sabe que eu não me esqueço de uma cena nossa? É. Vejo até seus olhos ali, tão perto dos meus, compenetrados em mim. Seu rosto sensível, tão puro. Só que eu não me esqueço mesmo é do teu sorriso aquela noite. Lindo. Lindo, mesmo, sabe? Você me deu vários deles depois, mas aquele, acredite, foi inesquecível. É... e tudo isso, agora, eu não tenho mais. Como pôde acontecer, meu Deus!?! (.............) Bom, só quero te dizer uma coisa: obrigado.

- Tu, tu, tu...

Flor e fuzil

Nunca li Sun Tzu. Sim, aquele autor do cultuado "A arte da guerra" que, segundo dizem, traz lições de batalhas para encarar a vida. Pode ser que seja um erro, talvez. Ou não. O fato é que revi o livro por esses dias no Big Brother, nas mãos do tal Alemão. Algumas cenas depois, o mesmo personagem estava lá, declarando guerra aos "oponentes".

Com o dedo em riste, o rapaz prometia a dois ou três que ia persegui-los, um por um, para vingar a saída de sua, humpf, amada. Medo. Foram estes fatos, aliás, que me fizeram pensar na dualidade (!) entre amor e ódio, entre o jogo passional e a guerra - e, principalmente, suas semelhanças.

Nos dois casos, há aquela fase de investigação sobre o outro. Há o momento de mandar sinais, sejam eles de lembrança ou ameaça. Sem contar os encontros, cuja estratégia de ambos lembra muito a das batalhas no front. Enfim. E porque então, pergunto a mim mesmo, que, embora tão parecidos, esses dois jogos tem sabores e resultados tão distintos? Porque um é tão bom e o outro tão desprezível? Não sei. Talvez devesse ler mesmo Sun Tzu.

Ser ou não ser

São aproximadamente cinco horas da tarde na avenida Paulista. O trânsito se espreme entre bandeiras e pessoas, todas estas protestando contro a visita do líder dos Estados Unidos, George W. Bush, ao Brasil. Com isso, São Paulo está tendo um dia do cão nesta quinta-feira, dia 8 de março de 2007: trânsito intenso em toda a cidade, barulho insuportável de gritos de protesto, buzinas e helicópteros.

A questão que me veio à cabeça, porém, foi outra. Será que eu, assim como grande parte da juventude contemporânea, está errada em pensar que o grande prejuízo da vinda de Bush a São Paulo é o caos imposto ao trânsito e a população? Ou será que devíamos pensar que o "senhor da guerra" pode estar no país para fechar mais um grande e inescrupuloso acordo com uma nação sub-desenvolvida, melhorando assim sua influência numa região cada vez mais "de esquerda"?

Temos que pensar em como chegar em casa seguro ou em gritar alto para que Bush deixe o país? Temos que nos preocupar com trabalho, horário, estudo ou parar todo o cotidiano para sair às ruas e mostrar engajamento? Temos que acompanhar a ampla cobertura da mídia sobre a chegada da comitiva estadunidense do sofá ou partir por aí queimando bonecos de pano do "malfeitor"?

Enfim, cabe a cada um pensar nisso. Talvez esteja explícito neste post, mas eu me incomodo em pensar no trânsito mais do que em qual seria a verdadeira intenção de Bush deixar seu país para percorrer a América do Sul. Me incomoda, mas não posso fazer nada. Seria muito melhor se os gritos ouvidos da Paulista nesta tarde ajudassem a mudar o mundo, mas todos sabemos - inclusive os manifestantes, creio - que isso é praticamente nada. É triste, principalmente num país aonde as manifestações populares já surtiram efeito um dia. É preocupante, mas a vida anda. Já o trânsito...

Em tempo: Pelo menos cinco dos meus contatos do MSN nesta tarde comentam o caos que vive o trânsito da maior cidade da América do Sul...