Amor de pombo

- Pombos se beijam?
- Oi?
- Eu perguntei se pombos se beijam.
- Por que isso agora?
- Ah, vi dois se beijando esses dias.

E lá estavam eles de novo. Ele mantinha a cabeça encostada no colo dela e olhava o céu azul do parque. Ela, por outro lado, só tinha foco para o rosto dele, cujos olhos se contorciam para encontrar os olhos dela enquanto falavam sobre amenidades.

- Sério? - completou ela.
- Sérissimo. Tava andando na rua quando vi um grupo de pombas. Duas se beijavam.
- Mmm. Devem se beijar. Da onde viria a expressão "os dois pombinhos"?
- Faz sentido.
- Viu?
- Mas será que existe amor entre eles?
- Entre pombos? Acho que não, né?
- Por que não? Eles se beijam por beijar?
- Talvez.
- Injusto.
- Injusto? Por que injusto?
- Porque é injusto o pobre pombo beijar a pomba e entre eles não existir nada.
- E?
- E o amor, como fica?
- O amor, querido, não existe.

E viu o brilho dos olhos dele se fechando com as pálpebras, que tremiam levemente. Só teve tempo de curvar o corpo para dar-lhe um beijo, como quem reafirma, sem palavras, o que foi dito anteriormente.

Por Julio Simões, em 10 de fevereiro de 2008.

2 comentários:

Felipe Held disse...

Engraçado e paradoxal: ter a cabeça no colo de uma garota é tão bom que se torna algo fora desse mundo.

Por outro lado, ter que contorcer os olhos para olhar no fundo dos dela, ainda que compense, incomoda bastante, fisicamente falando.

Jo disse...

singelo. foi a palavra que me veio à mente qdo terminei de ler.

e não jogue fora esse dom das palavras que vc tem, viu?