O velhinho simpático

Em uma época onde as salas de cinema são todas padronizadas, com seus sacos de pipocas enormes, modernas poltronas reclináveis e ar condicionado perfeito, pode-se dizer que o Gemini é um verdadeiro templo para quem gosta de cinema antigo. É preciso esclarecer, no entanto, que ser antigo não significa ser ruim - embora o trecho acima tenha dado essa impressão. Muito pelo contrário.

Localizadas dentro da galeria do prédio Winston Churchill (o popular prédio da Jovem Pan), na região da Avenida Paulista, as duas salas idênticas - daí o nome, Gemini, que significa gêmeos em italiano - possuem muitas características que os novos complexos cinematográficos não têm. A começar pela história, afinal o Gemini tem 33 anos (1975), enquanto grande parte das salas de shopping não tem nem uma década.

E não é só isso: desde a entrada você repara o cuidado com que ele foi concebido. Dos carpetes em tons vermelho-amarelo-preto (esq), marrom-verde (centro) e azul-amarelo (dir) até as poltronas de couro (vermelha em uma sala, azul em outra), o velho cinema da Paulista é um grande exemplo de resistência e preservação da tradição. Parecido a ele na região, só mesmo o Top Cine, que também foi inaugurado nos anos 70, mas está fechado há cerca de dois anos.

Mas voltemos à qualidade, afinal não é só de carpetes e poltrona que se faz uma boa sala de cinema. A programação, por exemplo, foi considerada uma das melhores da cidade pelo jornal O Estado de São Paulo, em seu Oscar das salas de cinema da cidade. Nesse quesito, o cinema empatou com o também esquecido Cine Arte Lillian Lemmertz - que ainda arrebatou o "prêmio" de pior sala de São Paulo.

O Oscar de melhor programação foi conquistado certamente devido a uma prática pouco adotada por outras salas: a de exibir um filme por horário. Afinal, mesmo tendo apenas duas salas, o Gemini consegue exibir oito filmes diferentes, de comédia a documentário. Nesta semana (14 a 20/11), por exemplo, eu indicaria quatro filmes para quem quiser se aventurar por lá: Na Mira do Chefe, Baby Love, Meu Irmão é Filho Único e O Aborto dos Outros.

O primeiro eu ainda quero ver, mas parece ser engraçado e ganha quatro estrelas em tudo quanto é classificação; o segundo também é comédia, assisti em um Noitão do Belas Artes e posso dizer que vale a pena; já o terceiro é outro que cogito ver em breve, principalmente por causa de uma crítica positiva do Merten; e, por fim, o quarto é um documentário bem construído, que me chamou muita atenção quando esteve em pré-estréia na Cásper Líbero.

Enfim. Se você gosta de bons filmes e repara minimamente no lugar em que está assistindo ao filme, vale a pena conhecer o Gemini. A exibição pode não ser das melhores e a poltrona pode não ter porta-copo, mas mesmo assim vale a pena. Afinal, é fato que há diferenças em ver um filme dentro de um shopping ou em um cinema de calçada. E se nenhum fator exposto até então te convencer a ir até lá, friso que o Gemini vale a visita pela simpatia. Me arrisco a dizer até que, se fosse um personagem, ele seria um velhinho gente boa. Ou oferecer paçoquinha como cortesia antes da sessão não é típico de um ancião bonzinho?

Mas já?

Como diz o ditado, a primeira vez a gente nunca esquece. Nem mesmo o primeiro dia na primeira faculdade. Afinal, aquela manhã de fevereiro de 2005 no prédio 900 da Avenida Paulista, quando quase todos ainda eram adolescentes recém-saídos da escola ou do cursinho, sem qualquer noção do que seria a vida acadêmica, certamente ficou registrada em cada um de nós.

A partir desta lembrança já bastante remota, que cada um deve ter recuperado neste momento, é possível começar o balanço do quanto foi possível evoluir em quatro anos como aluno da Faculdade Cásper Líbero. Em números quase exatos, porque jornalista insiste em não saber fazer conta, foram 1.398 dias e 33.552 horas desde a divulgação da lista de aprovados em primeira chamada do vestibular 2005 até o último dia de aula do quarto ano de Jornalismo. Porém, na prática, foi muito mais que isso.

De lá para cá, aprendemos a profissão tanto dentro das salas de aula e dos laboratórios quanto fora deles, nos corredores e nas redações em que estagiamos durante este período. Conhecemos pessoas que foram nossos colegas de sala e agora, oficialmente, de profissão. Alguns se tornaram diferenciados e farão parte do resto de nossas vidas, enquanto outros serão reencontrados ao longo do caminho. Assim também será com os professores, que durante estes quatro anos nos direcionaram e agora poderão ser colegas de trabalho.

É nesse momento que, como dizem, passa um filme da vida na cabeça. As aulas teóricas do primeiro ano, por vezes sem muita emoção, mas que deram noções de sociologia, antropologia e teoria da comunicação aos alunos recém-saído das fraldas; as primeiras aulas práticas do segundo ano, tão ansiosamente aguardadas, como rádiojornalismo; o terceiro ano do aprofundamento, com o reforço de matérias já dadas e outras novidades, como jornalismo básico e legislação, respectivamente; e, por fim, o quarto ano, em que não se fala em outra coisa a não ser o TCC.

Parece muita coisa, é verdade, mas foi pouco. Para mim, especificamente, a faculdade passou voando. Andar pelos corredores acanhados do prédio e conhecer pouca gente dá a noção exata de que eu estou ficando para trás. Por outro lado, é preciso reconhecer que uma nova fase da vida virá, e que para isso será preciso deixar essa para trás. Enfim. O espaço para expressar o fim é pequeno, mas a saudade já é grande.

Atleticanos à paulista

8 de novembro de 2008. Era fim de tarde de um sábado ensolarado, quando eu e o corintiano Diego nos encontramos no maravilhoso cruzamento da Ipiranga com a São João dispostos a conferir, perto dali, o encontro de torcedores do Atlético Paranaense que moram em São Paulo. Todos que passam pelo Despojo sabem (não sabem?) que eu torço pelo rubro-negro paranaense, embora comente pouco - afinal, nos últimos anos não tive muito o que comemorar. Porém, como sempre morei muito longe de Curitiba, me acostumei a ter notícias do clube pela internet e raramente ver os jogos pela TV.

Por isso, quando li no no Furacao.com que paulistanos estavam organizando uma embaixada, me animei e agendei minha ida ao centro de São Paulo. Nem mesmo uma puta dor de garganta que quase me impedia de falar evitou o passeio por aquela região da cidade que tanto gosto. Tudo pelo CAP. Pela área, procuramos pelo tal Novo Oba e o encontramos no meio da Antonio de Godoi, próximo à Rio Branco. Chegamos lá bastante cedo, por volta das 17 horas , uma hora e meia antes da bola rolar. Sentamos no balcão, já que o restante das mesas encavaladas no pequeno salão estavam lotadas.

Naquele momento, todos os olhares estavam voltados para a televisão de plasma de 32 polegadas, que certamente devia se sentir deslocada diante de tanta decadência. Nela, o Corinthians aplicava 2 a 0 no Avaí e se sagrava campeão da segunda divisão do Brasileirão. No balcão, um garçom me viu com a camisa rubro-negra e, num misto de curiosidade e hospitalidade, veio me perguntar: "Vocês que reservaram umas mesas para assistir o jogo?". "Não fui eu que liguei, mas é pra gente sim. É a torcida do Atlético Paranaense", respondi.

"Hm. E esse time aí tá no rebaixamento, né?", acrescentou ele. "Pois é, rapaz. Tá sim...", completei, com o sorriso amarelo. Como não tinha mais futebol a discutir, deixei o Diego conversando com o garçom sobre algo mais em alta: o Corinthians. Não muito tempo depois, porém, chegaram os primeiros companheiros atleticanos. Era Cláudio, que mais tarde viria a ser apelidado de Claudio Celso Petraglia por conta do seu cargo de presidente da reunião, que chegava acompanhado de outro colega rubro-negro cujo nome me foge no momento.

Assim, antes mesmo das 18h30, hora em que os onze do Atlético entrariam em campo na distante Florianópolis, a nação atleticana radicada em São Paulo já chegava no novo reduto. Uns se conheciam, outros não. Quase todos, que ao todo somaram mais de 30, portavam alguma coisa rubro-negra - por outro lado, nenhum objeto verde foi registrado. Apesar do pouco tempo para conversa, todo mundo logo se integrou e se voltou para o deprimido plasma de 32 polegadas. Em campo, Galatto; Zé Antônio, Rhodolfo, Antonio Carlos, Chico e Netinho; Valencia, Alan Bahia e Ferreira; Júlio César e Rafael Moura se posicionavam para enfrentar o Figueirense e afastar de vez o risco do rebaixamento.

A partir daí, todos os paulisto-atleticanos dividiram cervejas (eu, água sem gelo), broncas, uhs!, opiniões, gritos de guerra e comemorações de gols. Aliás, foram dois ao final: o primeiro marcado pelo volante-artilheiro Alan Bahia, aos 23 minutos do primeiro tempo; o segundo apenas aos 19 do segundo tempo, anotado pelo atacante e He-Man nas horas vagas, Rafael Moura, após váááárias chances perdidas - a maioria, por ele mesmo. No intervalo da partida, o sorteio de brindes patrocinados pelo clube ajudou a aliviar a tensão do segundo gol que não vinha. No apito final, aplausos ao time e votos de reunir novamente todo mundo para ver o Furacão. "Vamos tentar achar mais atleticanos perdidos por aí e tentar fechar um galpão maior", direcionou o embaixador. "Mas para um primeiro encontro até que fomos bem", completou. Um sucesso, eu diria. Um sucesso.

Cine Marabá - O cinema do coração de São Paulo

Dia 19, às 19 horas, na Cásper Líbero (Av. Paulista, 900 - 5º Andar).