Plin Plin - Parte 1

Poderia começar isso tudo com aquela típica frase do seriado 24 horas: "Estes acontecimentos foram registrados entre as dez e onze horas". Seria perfeitamente compreensivo, desde que substituísse as horas do exemplo anterior por nove e dezenove, respectivamente. Sim, fiquei por aproximadamente dez horas acompanhando o trabalho diário em uma emissora de televisão, a TV Tem de Bauru, afiliada da Rede Globo na região noroeste do estado de São Paulo.

Cheguei às 8h30, mas como o expediente do chefe de redação Denílson Monaco só começava mais tarde, fui atendido apenas as 9h10. Logo na chegada, fui apresentado à redação (a sala, não as pessoas) e logo me destinaram um estagiário (!) para mostrar as instalações da tevê. O lugar era pequeno, afinal, muito diferente do que se pode imaginar ser um complexo televisivo como o Projac, por exemplo, da mesma emissora carioca.

No andar superior, por onde se chegava por uma escadinha de poucos degraus e não por um moderno elevador, ficam as ilhas de edição, a própria redação, a sala do Cedoc (Centro de Documentação), a sala de manutenção técnica e outros pequenos lugares que o pobre estagiário soube me dizer o que era. No inferior, ele apresentou os estúdios e o camarim.

Me mostrou aonde os chefes comandam os telejornais da sucursal bauruense (o TemNotícias primeira e segunda edição, além do GloboEsporte local) e as salas onde são gerados programas semanais, como o Revista de Sábado (voltado ao público jovem). No já citado Cedoc, parei para ver a busca por uma fita de 1998 e outra de 2003 sobre pessoas que perderam documentos e tiveram que pagar punições por isso, como ter o nome sujo na praça ou mesmo ser confundido com bandidos e ser preso por isso.

A simpática mocinha estava louca atrás da fita, mas ainda teve tempo de pesquisar no sistema se encontrava alguma fita com o nome do meu pai, Ronaldo, que fora tema de reportagens relacionado a Secretaria Municipal da Saúde de Promissão, que comandava na época, ou seja, nos anos 90 do século passado. Porém, a prestativa moça não teve sucesso na busca e logo voltou ao caso dos documentos perdidos.

Eu, por outro lado, preferi seguir adiante. Nessa hora, o estagiário que me cicceroneava (ah, sempre quis usar isso!) já havia sumido e eu estava em meio ao vai-vem da tevê. Segui para a sala de redação e logo passei a acompanhar um dos editores que recebia os textos de repórteres das outras cidades. O caso agora era sobre um descarrilamento de trem em Botucatu (ou melhor, no meio do caminho).

Ali, soube como se organizam os editores e como funciona o sistema de envio de textos interno. Resumidamente, o cara sai para a rua atrás da reportagem e lá grava as chamadas "passagens", que são aquelas partes em que o repórter aparece falando sobre o assunto direto para a câmera, e as entrevistas com o que eles chamam de "personagens". Isto posto, quando o nobre repórter acha que está bom ele volta para a redação.

Caso seja urgente a matéria ou o cara tenha que se deslocar para outro destino ou até esperar mais coisa acontecer no local da reportagem, a fitinha viaja de moto para a redação para ir sendo editada e produzida para o telejornal mais próximo. O texto de que falavamos antes, porém, pode tanto ser transmitido por telefone celular à redação, quando for necessário imediatismo, ou o repórter pode deixar para redigi-lo quando voltar da rua.

O fato é que esse texto, que segundo os editores sempre vêm com erros, é colocado no sistema e editado pelos mesmos antes de ser dado como "fechado". O processo, aparentemente simples, se complica mais pelo tempo que cada matéria terá ou até mesmo pelo fato da fita (e do repórter e do texto) chegarem em cima da hora do jornal. "Em cima do laço", como eles mesmo dizem.

E, pasmem, o jornal só é fechado durante o próprio jornal. Vi as duas edições do dia e nas duas havia pelo menos uma matéria que ainda era editada nas ilhas enquanto o jornal já era apresentado no estúdio. Aliás, a apresentação do jornal renderia um capítulo à parte. Além dos exercícios bucais que os apresentadores fazem para aquecer - e espantar o medo, acredito eu - ainda tem piadinhas internas com o pessoal que comanda o jornal da "base" já explicada acima.

O clima é bom, mas tenso. Um erro de concordância ou um simples gaguejar já põe em risco todo um jornal. Sem falar nas trocas de ordem das matérias, que acontecem a cada intervalo comercial. Segundo Thaís, a apresentadora a quem tive o prazer de acompanhar por alguns minutos na redação e depois no estúdio, os erros são comuns.

Perguntada qual teria sido seu maior erro, não hesitou e respondeu. "Foi quando eu falei 'mentira' no ar. Disse um número que achei ter lido no TP (tele prompt ou aquele lugar aonde passam as letrinhas para o apresentador ler) e não era. Na hora, emendei um 'mentira' e disse o número certo", explicou Thaís, com um riso constrangido. "É que eu tenho mania de falar isso e desconcentrei", completou.

Além disso, aproveitei a simpatia da moça, que dividia sua atenção comigo e com o computador e com o telefone e com a redação e só, e perguntei o que os apresentadores teimavam em conversar durante os créditos ao final do programa, naquela hora que apaga a luz. Depois de me explicar que os jornais da TV Tem não terminam assim, foi solicita e respondeu que não conversam nada. Absolutamente nada. "É constrangedor até. Demora muito para passar", analisou.

E pela manhã inteira conversei com repórteres que ali chegavam e com editores. Nisso, com o passar da hora, a redação ia fervendo. Literalmente. Era como a água no fogão, onde aos poucos as moléculas passam a se agitar mais e o espaço vai ficando menor e mais tenso. Era quase hora do jornal do meio-dia, o chamado "T1" no dialeto local.

Sem perceber, havia emendado uma conversa com outra editora, que depois de me explicar mais um pouco do andamento da redação, passou a me falar de sua vontade de trabalhar com internet, já que eu havia dito que estagiava na GE.Net. Ela ainda revelou ser de Araçatuba e o papo, que ia bem, só foi interrompido por ela para alertar que faltavam poucos minutos para o jornal.

Fui assistir os primeiros minutos do telejornal na sala de comando. Muita correria para acertar os detalhes com as outras cidades que participariam do jornal, com o link (repórter ao vivo direto de algum lugar, naquele caso uma escola), com a ilha de edição (que ainda preparava coisas para ir ao ar), com os apresentadores, entre eles. Dez segundos antes, um "boa sorte a todos e bom jornal" foi a senha para o início da apresentação.

Durante os quase 40 minutos de programa, tudo normal. Como se vê na televisão. Salvo as conversas no intervalo, regados sempre à uma nova passada nas folhas do script. Encerrado o segundo jornal do dia (antes teve o Bom Dia Cidade, que não acompanhei), a redação voltou ao normal e as conversas paralelas ganharam força. Fui almoçar para acompanhar, durante a tarde, uma cobertura externa. E tudo ia voltar a se acelerar em menos de meia hora.... (continua no próximo episódio).

1 comentários:

Lui disse...

Hahahaha...certeza que eu ia perguntar o que eles conversam durante os créditos. Fundamental pergunta!

E adorei a referência a 24 Horas!

Beijo!