Quando eu tinha mais ou menos 12 anos, uma das coisas que eu mais gostava de fazer era jogar futebol de botão. E tinha toda a preparação: comprava as equipes (e às vezes apelava para a fabricação própria mesmo), organizava as tabelas dos campeonatos, imitava a torcida. Tudo isso para, só aí, botar o time em campo. Raras vezes, porém, é que eu jogava contra alguém. Preferia disputar comigo mesmo. E só.
Foi assim por muito tempo - e em várias situações, aliás. Com a coleção de bonequinhos do Cavaleiros do Zodíaco, desenho dos anos 90 que hoje eu não agüento assistir nem a propaganda; com os carrinhos que eu sempre tive; com o balde vermelho de Lego. Em todas as brincadeiras da idade, preferia ter apenas a companhia de mim mesmo. No máximo, chamava um colega mais próximo - e isso às vezes só.
Com os carrinhos, aliás, criei uma cidade. No quintal do fundo de casa, creio que com giz de cera, rabisquei a planta da cidade perfeitamente. Tinha o centro, os bairros e as longínqüas rodovias. Afinal, era essa a intenção: fazer a frota de carrinhos rodar por aí. A cidade, porém, sempre teve como habitante real - e chefe de tudo - uma única pessoa: eu.
Mas, caro leitor, não é isso que está pensando. E antes que pergunte, digo que nunca fui anti-social. De tempos em tempos, reuniam-se em casa os colegas da escola, seja para fazer trabalho ou jogar bola na varanda minúscula. Bom, é bem provável que alguns já iam pensando no lanche sempre farto que minha mãe resolvia oferecer no meio da tarde. Era a única coisa que interrompia a brincadeira.
Participei também, como idealizador e atleta, de uma experiência esportiva na rua da casa de um amigo meu. Foram as Olimpíadas da Casa do Vítor - nome do amigo meu, óbvio. Com tocha olímpica e tudo, criamos modalidades pouco convencionais, mas fáceis de serem realizadas ali. Mesmo assim, como toda prática na rua, a competição tinha seus inconvenientes. Os carros que insistiam em passar, a vizinha velha e chata que insistia em reclamar, os amigos do vizinho - e não da turma - que insistiam em querer participar. Mas tudo bem, deu certo.
Hoje, quase nove anos depois, não é mais assim. Óbvio, até. Vivo numa cidade com a população - e número de carros - cerca de mil vezes maior, tenho aproximadamente dez vezes mais coisas para me preocupar e fazer e as responsabilidades já são infinitamente maiores do que naquela época, quando a única era estar em casa ao anoitecer.
Mas não pense que isso são lamentos típicos da velhice ou a crise dos 21 anos, que estão desembarcando aí no próximo mês. É só uma constatação, que pode ser resumida e simplificada em dois pontos. Antes, eu jogava futebol de botão sozinho e me divertia. Hoje, não consigo mais almoçar sozinho.
Eu, cá com os meus botões...
5.4.07 Por Julio Simões às 16:02
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4 comentários:
Rapaz, joguei botão sozinho (eu x eu mesmo) dos 8 aos 14 anos! Catorze!!! E tenho todos os campeonatos devidamente guardados aqui, registrados para a posteridade. Bons tempos... Mas não estamos sós: Chico Buarque também fazia torneios solitários de botão. Bom companhia, convenhamos.
ops... BOA companhia, eu quis dizer. Boa, não! Ótima.
que bonito, Julio!
gostei, tanto desse quanto do post anterior a esse, aquele menor...
esse até me lembrou aquele exercício que fiz, alguns anos atrás, da autobiografia... uma reflexão boa!
depois, se quiser, conversamos mais sobre isso.
beijos
ah, comentários pontuais:
*gostei mto do título!
*não acredito que alguém da nossa geração ainda tenha se divertido com futebol de botão...
*nunca conheci menino algum que tenha se importado em desenhar a cidade em que seus carrinhos rodariam... interessante isso
*ah! as práticas de rua e a turma da vizinhança... tão típico de cidade pequenas!
*feito a mão ou no computador?
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