O engradado e a fila

Sempre quando relembra esta história, minha mãe abre um sorriso e conclui para quem ouve que eu sempre fui assim, certinho demais. A cena, que ela adora relembrar em datas comemorativas e outras confraternizações em família, aconteceu provavelmente em 1993, quando eu tinha apenas sete anos de idade. Era a primeira vez que encarava um colégio grande, com pessoas estudando da primeira série do primário até o terceiro colegial. Tanta gente que, nos intervalos, era quase impossível fugir de fila em bebedouros, banheiros, merenda e cantina.

Depois de alguns dias freqüentando uma das salas da primeira série do ensino fundamental, porém, minha mãe conta que eu comecei a reclamar da cantina. Insistia que não queria comer mais lá, mas não justificava. Porém, com aquele jeitinho só as mães têm com os filhos, ela conseguiu descobrir o motivo da minha insatisfação: as filas. "Mas o que tem as filas, filho?", provavelmente indagou minha mãe. "Demoram muito, mãe", certamente respondi.

Porém, a desculpa não satisfez minha mãe, que continuou desconfiada com o que estava me fazendo desistir de comprar um salgado e um refrigerante na cantina da nova escola. Passaram-se alguns dias até que ela resolveu novamente perguntar sobre meu problema com a lanchonete do colégio. "Filho, por que você não gosta da fila da cantina? Tem alguém te perturbando?", arriscou. "Não, mãe", respondi a seco, como toda criança pequena que não sabe explicar direito qual o problema.

Mas minha mãe não desistiu. "Filho, me conta como você faz no recreio. Você sai da sala e vai direto para a cantina?", perguntou ela, tentando outra forma de abordagem. "Isso. Saio da sala, vou para a fila da cantina e compro um enroladinho e uma Coca", respondi, dando maiores detalhes daquilo que, na época, era praticamente uma aventura para mim. "E só?", reforçou. "Depois eu entro na fila de novo para devolver a garrafa da Coca, mãe. Só que demora muito. Não quero mais", revelei.

Pronto. Estava solucionado o enigma: duas filas por dia me faziam perder todo o intervalo. Minha mãe, que toda vez se diverte com a história, sempre complementa no final, até quando repete o caso hoje. "Esse menino era muito certinho na época, né?", finaliza, com um sorriso largo de orgulho pela boa criação do menino. Sim, mãe. Até hoje eu sou meio certinho assim, apesar de não entrar mais em filas para devolver engradados de refrigerante.

Por Julio Simões, em 3 de abril de 2008.

ps. O texto acima é um trabalho da faculdade. Quando sair a nota, atualizo.

9 comentários:

Ane Talita disse...

Quando a gente é criança, é tão inocente...=) Que fofura, pegar a fila para devolver a garrafa...=)

beijo!

Anônimo disse...

Vai escrever bem assim lá longe, ô torcedor do CAP... :)

Se tirar menos que 9 (não digo 10 para não parecer muito paga-pau), esses professores da Cásper são uns brincalhões.

Thá disse...

Esse texto está com toda pinta de "proposta do Welington"! Grandes chances de voltar com um recadinho do professor: "belo texto!".

;)

Anônimo disse...

[momento súbito de saudade da Cásper on]

Pô, as provas do Welington eram muito legais... Aliás, as aulas dele eram muito fodas também!

[momento súbito de saudade da Cásper off]

Milly disse...

eu quero um trabalho assim pra fazer também! minhas aulas tipo terapia de grupo são traumáticas, envolvem vozes caricatas em cima de um palco.
mas ooooown que bons modos!
vc tinha que postar isso na comunidade "bonzinho só se fode" ahahaha

beeeeeeeeeeeeeijo ;)

Felipe Held disse...

A minha escola não tinha isso de devolver as garrafas, mas eu odiava a cantina mesmo assim por causa das filas.

Lui disse...

Hahahaha, que engraçado, o meu texto tem a mesmíssima moral da história!

Acho que vou te copiar e colocar o meu no blog também!!!!

Beeeeeijo!

Anônimo disse...

Faço minhas as (primeiras) palavras do Fábio e as da Thá.

Muito bacana a história. Fiquei até com vergonha da minha - que prometo igualmente publicar.

Carolina Maria, a Canossa disse...

Nota 10!